O sentimento de vergonha, embora
a não surpresa de muitos, de ter uma cidade-sede dos Jogos Olímpicos comprada
não pode ser exclusivamente e tão somente dos brasileiros. Pesquisas rápidas e
a leitura de certas obras de jornalismo investigativo relatam que tal fato advém
desde os Jogos Olímpicos de Seul – 1988. Seja pelo suborno com presentes,
viagens, cargos, prestígios e regalias aos membros do Comitê Olímpico
Internacional, seja por agrados à familiares dos mesmos ou para benefícios aos seus
países de nascença.
Além do mais, não é um ato
exclusivo dos países/cidades que “ganharam” a realização dos Jogos, tanto das
edições de verão e inverno, mas sim, das outras cidades que concorriam ao
pleito. Fato esse que explica o porquê de as cidades perdedoras não virem a
público e revelar as ilegalidades dos processos. O caso mais alarmante e
gritante até o momento foi a eleição de Salt Lake City para os Jogos de Inverno
em 2002 (http://www.nytimes.com/2000/05/27/sports/olympics-memo-details-payments-made-to-influence-bids.html).
A compra e o próprio sistema de
eleições para as cidades-sedes dos Jogos Olímpicos é um “problema” e sempre
surge para arranhar um pouco a imagem mais que centenária dos Jogos Olímpicos e
do COI. Porém, logo é abafada.
No caso brasileiro que envolveu
membros do COB e de governos municipais e estaduais, o suborno veio de forma
direta e sem mais delongas - e aí vem a síndrome do viralatismo brasileiro que
eu tento não abraçar. Sem querer saber qual a joia favorita da esposa, o sonho
de consumo do filho mais velho ou o número do sapato da filha mais nova (essa
última frase é um capítulo do livro “O Senhor dos Anéis: Poder, dinheiro e
drogas nas Olimpíadas Modernas” de Simson e Jennings - https://www.estantevirtual.com.br/b/vyv-simson-e-andrew-jennings/os-senhores-dos-aneis/854056972)
as autoridades responsáveis pelos Jogos no Rio foram para o pagamento direto de
propina para a obtenção de votos.
A consequência disso, além das
prisões preventivas, foi a suspensão do Comitê Olímpico Brasileiro pelo COI. De
acordo com seu Press Release (https://www.olympic.org/news/decision-of-the-ioc-executive-board-regarding-mr-carlos-nuzman-and-the-brazilian-olympic-committee),
esta suspensão provisória acarreta:
1- O congelamento de subsídios e
pagamentos do COI para o COB – fato esse que coloca o esporte de alto
rendimento brasileiro numa tempestade, já que o orçamento da pasta do
Ministério do Esporte pode ser 86% menor para o ano de 2018 além dos cortes já
evidenciados no ano de 2017. Ou seja, só inflama a discussão acerca do papel do
Estado em fomentar e desenvolver o esporte. Será que ele deve ter a maior
parcela nisso ou precisaríamos de mais iniciativas de outras esferas como a
privada?
2- O COB está impedido de exercer
os seus direitos na Associação dos Comitês Olímpicos Nacionais. O que acarreta
na perda de voz e prestígio de um país que acabara de sediar o evento.
3- O terceiro ponto é o mais
intrigante da suspensão. Embora suspenso, o COB não sofrerá punições no que
tange a representação dos símbolos nacionais brasileiros nos eventos organizados
pelo COI, como justificativa de proteger os interesses dos atletas brasileiros.
Portanto, nos Jogos Olímpicos de inverno em PyeongChang – 2018, nenhum atleta
brasileiro deixará de representar a bandeira e o hino nacional. A partir disso, cabem duas
vertentes argumentativas e dedutivas nesse ponto.
A primeira é a confirmação da acusação,
de forma sútil, da participação e da conivência do Comitê Olímpico Internacional
nas ilegalidades dos processos de eleições das sedes. Isso porquê, além da suspensão
dada ao COB e todas as punições ofertadas a Carlos Nuzman, seria de total
conformidade em relação a transparência e ética que o COI e o Movimento
Olímpico prezam tanto, punir aqueles que receberam tais propinas, embora seja
apenas um nome revelado. Contudo, sabemos que se o caso caminhar a passos
largos, revelará ao mundo acontecimentos que colocaria governos, empresas privadas
e nomes importantes da aristocracia mundial nas partes sujas dos noticiários e
poria em abalos sísmicos o “Clube” (grupo de membros do Comitê Olímpico
Internacional, líderes mundiais e donos de empresas privadas que praticam
ilegalidades desde que Juan Antonio Samaranch presidiu o COI (1980-2001) de
acordo com Simson e Jennings, 1992).
A segunda vertente é a
excepcionalidade do caso em relação aos atletas brasileiros. Lembrando que a
Índia em 2014 e o Kuwait em 2016 foram suspensos do quadro de membros do COI
pelo mesmo princípio: o descumprimento dos preceitos da Carta Olímpica. No
caso destes três países (Índia, Kuwait e Brasil), foi pela falta de uma boa gerência nos seus Comitês.
Em relação a Índia, foi suspensa pela intervenção e corrupção na eleição da
presidência do Comitê Olímpico Indiano. Uma das consequências foi a
participação dos seus atletas sem a representação nacional em Sochi-2014, ou
seja, como Atletas Independentes Olímpicos. Referente ao Kuwait, a punição veio
pela intervenção governamental nas gerências do Comitê Olímpico Kuaitiano e sua
consequência foi a não representação dos seus símbolos nacionais no Rio-2016.
Ou seja, foram como Atletas Independentes Olímpicos.
Se corrupção e suborno é um indicativo
de má gerência, por que o COB não sofreu a mesma penalidade em relação a
representação nacional em 2018? Se a resposta é a proteção dos interesses dos
atletas, por que não houve a mesma proteção para atletas indianos e kuaitianos?
Como defendi em minha dissertação de mestrado, pesa e muito o poder que um
Comitê Olímpico Nacional possui no COI, seja esse peso por ganhos de medalhas,
maiores lucros ou influências políticas (Lembrando que João Havelange e o
próprio Carlos Nuzman foram membros honorários do COI).
Fato é que o Brasil não integrará
a delegação não nacional dos Atletas Independentes Olímpicos.
Fato é que realmente o poder é o
sexo dos velhos.